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quarta-feira, 2 de março de 2011

Espaço Ponto de Vista: A Cegueira Assusta

Fui acometido por uma infecção no olho direito chamada Uveíte posterior. Quem olha pra mim não percebe que estou doente, pois não há qualquer vermelhidão ou mancha que denuncie meu estado de enfermidade. O único sintoma, e o mais grave, é a perda momentânea da acuidade visual. Estou enxergando apenas 10%. Às vezes bate um desespero, pois parece que uma película, que mais lembra um pára-brisas enlameado de um automóvel, tomou conta de todo o meu olho, impedindo que eu enxergue com tinidez. É horrível!
O resultado de tudo isso é que tenho que fazer as coisas mais simples do dia-a-dia com muita cautela e atenção. Dirigir nem pensar. Noções de profundidade e distâncias ficaram comprometidas.
Às vezes penso como seria a minha vida se eu perdesse a minha visão? Uma pergunta assustadora, mas que me leva a refletir muita coisa. O receio de temer a perda da visão está ligado, é obvio, ao impedimento de não poder mais contemplar aquilo que, para nós, representa as coisas belas da vida. E o conceito de belo, para nós que enxergamos sem deficiência, é a contemplação do exterior, num endeusamento que quase sempre sentimos apenas com um dos sentidos; uma paisagem, a mulher amada, nossos pais, as flores, o mundo. Portanto, acho eu que os cegos têm uma percepção maior da vida, pois sentir a vida apenas com os olhos, muitas vezes, nos leva a julgar, de forma equivocada, situações e coisas sem o conhecimento do seu devido valor.
Tudo isso me faz lembrar daquele famoso ditado que diz assim: “o maior cego é aquele que não quer ver”. É uma frase de efeito e de muita reflexão, que nos faz concluir que os verdadeiros cegos não são apenas os que possuem um problema físico, mas sim todos aqueles que se negam a perceber as coisas dignificantes da vida. Esse ditado e sua profundidade foi muito bem trabalhado por José Saramago, em ‘Ensaio sobre a Cegueira’; a obra retrata a vida de pessoas normais, que num passe de mágica, ficam cegas. A barbárie, a falta de humanidade, amor, esperança, solidariedade são alguns sentimentos trabalhados na obra de Saramago.
Portanto, penso que a vida de um cego deve ser bem diferente da que vemos e sentimos com os dois olhos. Não que seja pior ou melhor, mas apenas diferente, pois o ser humano tem que se adaptar a novos sentidos, ou melhor, tem que aprimorar os sentidos que antes eram subutilizados; o tato, a audição e o olfato devem ser adaptados à nova vida.
Espero ficar logo curado dessa enfermidade, mas também, espero não cair – se é que já não estou – na cegueira do dia-a-dia aqui no Brasil.

(Por Franco Aldo – 02/03/2011 – às 11:34hs)

Um comentário:

  1. Por várias vezes já me peguei imaginando como seria se eu perdesse a visão. Normalmente isto acontece quando estou trabalhando, à frente do computador. Isto exige demais da visão e, não raramente, saio com os olhos lacrimejando. E aí vêm tal pensamento. Como seria não poder ler mais um bom livro, não mais contemplar a mulher amada, jogar com o filho? Por outro lado, quem é deficiente visual lê um bom livro, contempla a mulher amada e joga com o filho. De uma maneira mais sublime. O que nós, que enxergamos, deveríamos aprender a fazer.

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