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quinta-feira, 4 de agosto de 2011

CONTO: O Peão que traiu a mulher com a filha do Coronel

Antes mesmo das cinco, Batista já aguardava o encontro com muita impaciência. Virgínia só foi aparecer depois de vinte minutos de atraso. Batista suava, suava muito, estava fedido. Cheiro de homem do mato, de peão. Virgínia chegou bela como nunca. Estava vestida com um vestido transparente azul-claro, onde a calcinha branca e minúscula, quase imperceptível, transparecia na imensidão daquelas nádegas lisas. Batista ficou louco. Mesmo antes da conversa queria agarrá-la, mas se conteve. Virgínia fazia de propósito, sabia que Batista não se agüentaria por muito tempo. Veio daquele jeito porque queria algo. Sua viagem para Belém só iria acontecer na semana seguinte, e mais três ou quatro dias de sexo sem compromisso não faria mal a ninguém. Veio muito sedutora e charmosa. Apoiou-se na mureta de madeira do curral, empinou sua enorme e alva bunda, onde ficara a observar o descampado à frente. Perguntou o que Batista queria. Batista, no momento, estava muito excitado, não sabia o que responder. Tomou fôlego e disse que estava apaixonado por ela e que não queria deixá-la. Virgínia, porém, fez uma cara de espantada, como se fosse surpresa aquela declaração. Era muito matreira e experiente em negócios de sexo e paixão. Sabia que homem no mundo não resistiria por muito tempo ficar longe de seus carinhos, de seu charme, de seu cheiro prazeroso, de seu fogo. Assim era Virgínia, amada e odiada por muitos. Mulher sedutora e inteligente, a mulher da vida do peão Batista, dos seus sonhos, do seu tesão profundo, de sua essência de macho capiau, a mulher que poderia lhe fazer feliz, de dar-lhe um filho. Um filho que provavelmente seria muito bem feito. Se existisse um teste de qualidade, logo seria acusada a grande porcentagem de amor oriunda do corpo de Batista. Verificaria que a semente de Virginia fora totalmente invadida por uma multidão de Batistas, loucos, em desabalada carrera.
Virginia se fez de desentendida. Tentou convencer o peão a voltar ao seu juízo, na medida em que tentava encontrar o seu... De súbito, os dois se atracaram pelo chão sujo, como dois animais no cio, se beijando, se chupando, apalpando ambas as profundezas de suas carnes. O suor misturado com saliva em todos os cantos dos corpos. O sangue quente aflorado nas partes mais escondidas, o cheiro de bosta de vaca no curral imundo. Eram detalhes que conferiam à cena uma atmosfera bestial e sem limites, onde ambos esperavam a derradeira hora do gozo. Virgínia já não possuía mais a minúscula calcinha branca, tinha sido arrancada e rasgada – ou engolida? – pelo Batista. Os dois se amavam como dois animais selvagens, como se fosse a última vez que iriam se ver. Foi um dos sexos mais intensos na vida da fogosa Virgínia e um dos mais demorados também, feito com capricho, detalhado, lento e vagaroso, mas com um poder de sucção sem igual, feito por gente que se conhecia bem; que se entendia; que se amava...
Por parte do Batista, um amor proibido decerto, ora... Onde já se viu homem casado trair a mulher de casa? Era contra as leis de Deus. Não era direito. E Batista sabia muito bem disso. Logo que começou seu relacionamento, às vezes, passava noites em claro. Não sabia se era a ansiedade de possuí-la no outro dia, ou algum tipo de remorso por sua traição. Sinceramente não sabia. Mas pra quê se preocupar? Gerusa era apenas uma mulher rude e ignorante como ele, mas sem o apetite do prazer que tanto lhe sobrava, sem o asseio de Virgínia, sem as suas idéias de mulher inteligente, sem a sua beleza, sem a sua sensualidade. Além do mais, a igreja já tinha sepultado seu corpo e sua mente. Vivia nos tempos dos Faraós do Antigo Egito, na época das profecias de Moisés, na época de Jesus Cristo... Estava feia e acabada, fedia como um gambá. Tinha dia que não tomava banho. Como ser fiel a mulher desse jeito? Não dava, não tinha como. Era a conclusão mais íntima do peão Batista. Queria era aproveitar aquele corpo divino, prazeroso. Queria cada vez mais aprofundar as tensões de seu gozo. Queria um mais forte e mais prolongado. Queria era aproveitar... Que se dane Gerusa! Que se torne uma mulher de verdade, tarada!.. Que fique com sua maldita igreja!..... Aaahhh, aahh...
Batista ficaria vivendo assim o resto de sua vida. Gerusa em casa e ele comendo a filha do patrão. O que os olhos não veem o coração não sente – não é esse o ditado popular? Sim, mas os olhos de Gerusa viram!...Viram e se esbugalharam de pavor. Aquela cena dos infernos. Aqueles corpos em estado bestial. Aquela fúria carnal, sexual, animal... Foram os motivos para que ela recitasse um trecho do Apocalipse e saísse gritando: É o fim do mundo! É o fim do mundo!
Diante daquela visão medonha de Gerusa a observar os dois quase alcançando o nirvana do prazer, Batista resolveu fechar os seus olhos e gozar com todas as suas forças. Se pudesse, se transformaria num corpo líquido e único de esperma e entraria no corpo de Virgínia, selaria o fim da sua existência física ali mesmo. E como foi bom! Mas durou muito pouco... Virgínia que, até em tão, não tinha percebido a presença da mulher do peão a observar seus corpos unidos que formava um só corpo, levou um susto tremendo ao escutar as pregações apocalípticas de Gerusa. Rapidamente virou-se e viu aquela mulher maltrapilha e maltratada correndo feito louca e gritando a chegada do fim do mundo... O gozo já tinha passado. Virgínia ficou espantada. Olhava para o peão e este de cabeça baixa não sabia o que dizer. Pra ele, também, o gozo já tinha passado. E pior, aquela imagem de Gerusa olhando para ele e sua indiferença com ela, com o flagra, com a vergonha, agora começava a perturbar forte a cabeça do peão. O que fazer agora? Era a pergunta mais óbvia que vinha na mente de Batista. E Virgínia, o que achava de tudo aquilo? Aliás, não ficaria nada bem, a filha do Coronel Jacinto ser vista como uma vaca, uma piranha, uma qualquer, que dava pra qualquer um. Batista não sabia, estava perdido. Não iria nem pra casa àquela noite. Não tinha coragem. Pensou em apenas poucos segundos, como se estivesse a meditar já por várias horas. Pensou até em largar tudo, fugir. Ir embora de vez. E Virgínia, será que iria com o ele? Não, Batista conhecia bem a sua fêmea. Ela não fora feita pra viver agarrada com homem debaixo dum teto. Ela é livre, muito livre. Quer é viver a vida. Gozar com muita gente ainda. Ele que acabou caindo nessa. E agora não tinha ninguém. Nem Gerusa, nem Virgínia.
Enquanto na cabeça do peão um turbilhão de coisas se passava, Virgínia vestia sua roupa suja (sem a calcinha) e, quando acabou, disse:

– Batista, acho melhor você ir atrás dela. Ela pode cometer uma loucura – Disse Virgínia penteando os cabelos cheios capim pendurado.

– Ela já estava louca faz tempo! Deve ter ido embora pra casa da mãe, lá em Poço Grande, e com razão. Não foi direito o que fiz com ela. Apesar de tudo, se não gostava mais.... que deixasse de vez, e não ficasse com a infeliz desse jeito. Pobre Gerusa, sua cabeçinha fraca já deve estar pensando que o diabo levou minha alma... Não tenho mais coragem de por os pés em casa. – E olhando para Virgínia perguntou:

– E você minha potranca...? Que que tu acha que devo fazer? Ir atrás da pobre? Ir embora? Ou continuar em casa como se não tivesse acontecido nada?... O que eu queria mesmo era ir embora contigo, isso sim!

– Ora Batista, não seja infantil, desde o nosso primeiro encontro te disse que não queria nada sério. Não sou mulher de me apaixonar fácil assim. Gosto de você por nossas horas de prazer. Não me arrependo de nada que fiz até hoje. E você ponha os pés no chão. Se por acaso a gente resolvesse se juntar, meu pai nunca iria consentir e acabaria dando um sumiço em você. E como já te disse, não é isso que quero pra minha vida... Vá atrás de sua mulher e peça perdão, mesmo que não fiques com ela, mas pelo menos explique o que aconteceu. É a única coisa que você pode fazer.

As palavras de Virgínia soaram fortes na cabeça do peão. Na mente de Batista se formava uma confusão geral. A frieza daquelas palavras apontava para o único problema daquela confusão, ele, Batista, peão ingênuo, usado pelos caprichos daquela mulher rica, bonita, que poderia ter toda sorte de homens em sua vida; homens bonitos, ricos, inteligentes... Não um peão de fazenda, semianalfabeto, bronco, fedido. O que aquela mulher tinha visto nele? Ele que estava tão bem com Gerusa, mesmo com seus problemas de hormônio.
Batista tentava encontrar, em sua limitada cabeçinha de peão, as respostas de suas atormentações. Lembrou de Gerusa e a sua ingenuidade. Na verdade ele era mais ingênuo do que ela, não conseguiu acordar de sua insensatez com aquela mulher fora de sua realidade. Todos os dias, criticava interiormente as condutas de sua mulher; seu pensamento; sua aparência, mas não percebia que ele é que estava mudado... Diferente ao seu mundo, um estranho em sua cabana, mais um seduzido pelos amores de Virgínia.
Antes mesmo dos dois saírem do curral, o casal foi surpreendido pelo olhares desconfiados do coronel Jacinto!
Virgínia empalideceu. Batista sentiu o nó na garganta que não descia e nem subia, estava petrificado – de terror? De vergonha? Ninguém sabe, mas foi o primeiro a tentar se explicar:

– Coroné, o senhor aqui! – nitidamente surpreendido.

– Ora seu Batista, que pouca vergonha é essa aqui. Você com minha filha! E essa gritaria dos diabos? E você Virgínia? Me dê uma explicação convincente! Eu já estava desconfiado, bem que o Teodoro disse para eu abrir o olho contigo, cabra-safado!

– Pa..Pai... Não é nada disso que o senhor tá pensando!

– Você tá pensando que sô idiota! Vocês dois estavam fazendo o quê no curral, a essas horas, sozinhos?! E você desse jeito, toda suja e rasgada!... Já sei... Seu Batista devia estar fazendo o seu serviço sujo, currando você! Sua safada! – imediatamente aplicou um tapa na face de Virgínia.
Batista tentou esboçar uma reação, mas o coronel instintivamente puxou uma arma que estava em sua cintura e apontou para o peão.

– Fiquei ai no seu canto seu cabra, que depois agente se acerta. Aqui o negócio é de família.

Virgínia, ao se recuperar do tapa, disse a seu pai que iria lhe contar tudo o que tinha acontecido, que abaixasse aquela arma, que o Batista não tinha culpa de nada. Ela que tinha começado. Pediu a seu pai que o deixasse ir, que não cometesse nenhuma injustiça. Disse que a gritaria tinha sido da mulher do Batista, que flagrou os dois se amando. Acabou convencendo o coronel que Batista já tinha problemas demais em casa.
Logo depois, o bruto abaixou a arma e disse para o peão capá-mula, que noutro dia os dois conversariam...

(Por Franco Aldo – Escrito no ano de 2005)

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